Pobre Serra da Estrela...mais do mesmo!
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Pobre Serra da Estrela...mais do mesmo!


Uma pessoa chega a casa e lê "mais do mesmo", ou seja, mais uns milhões para o turismo da Serra, ou seja, mais uma tentativa para acordar o gigante adormecido (expressão muito usada durante tempos pela imprensa regional, mas que a mim sempre me causou os maiores receios e angústias...). Ora, mesmo que estes milhões se venham a concretizar, não me deixam particularmente eufórico e passo a explicar porquê...

Em primeiro lugar, nada se diz como se vão (tentar) resolver os principais problemas da Serra da Estrela, existindo sempre a tendência alarmante para se esquecer que estamos a falar de um território que é Parque Natural, o qual deveria ser visto como uma mais valia por quem gere o turismo e não como uma ameaça...se não, vejamos:

- Os milhares de hectares de floresta e matos que ardem todos os anos, com consequências não apenas na flora e fauna, mas também sobre os solos e a infiltração das águas, serão culpa do Parque Natural?
- As construções anárquicas que fazem das Penhas da Saúde um dos mais desordenados aldeamentos de montanha da Europa ocidental (ou uma das mais caóticas mini-cidades, para fazer a vontade a alguns...) serão responsabilidade do Parque?
- E o que dizer sobre o caótico trânsito automóvel nos pontos mais altos da Serra, com consequências não apenas sobre o meio ambiente mas até sobre a segurança das pessoas (alguém imagina como será a evacuação simultânea de centenas de viaturas automóveis em caso de tempestade de neve?...) será também uma imposição burocrática do ICN?
- E as toneladas de lixo abandonado serão elas também obra de funcionários ultra-zelosos do Parque?

O Parque Natural se tem culpa, nestas e noutras questões, é por uma certa cumplicidade silenciosa; ou seja, uma coisa é não ter fundos, nem funcionários em número suficiente, outra bem distinta é a falta de capacidade para pelo menos tentar seduzir as populações locais para a causa da preservação do território serrano... Acresce que, por parte dos (ir) responsáveis locais pelo turismo, não existe sequer a percepção de como estas questões ambientais afectam o próprio turismo. Haverá turistas interessados em conhecer paisagens lunares resultantes de incêndios florestais? Ou em conhecer uma natureza onde se pode encontrar todo o tipo de lixo? A Região de turismo deveria ser das primeiras a mostrar preocupação com estas e outras problemáticas ambientais mas isso seria provavelmente pedir de mais.

No entanto, para tentar contrariar a falta de uma visão estratégica conjunta sobre o sector do turismo na Serra, foi encomendado um estudo (Plano Estratégico de Desenvolvimento Integrado do Turismo na Serra da Estrela), à Universidade da Beira Interior...o qual nem sequer chegou a ser arquivado no fundo da gaveta, pois como provavelmente não referia o que algumas câmaras municipais ambicionavam, estas ignoraram a própria apresentação pública do documento (documento, sublinho, mandado executar a seu pedido). Em resumo, morreu à nascença, a única tentativa de aplicar uma estratégia sustentada e comum a todo o território serrano. Só lamento o tempo perdido pelos ingénuos que ainda acreditam que este tipo de iniciativas resultam num país como o nosso, onde tudo se faz sobre o joelho e o "desenrascanço" é uma ciência...

Por último, temos a turistrela, e a incompetência de quem insiste em não perceber o óbvio...que o turismo de neve na Serra da Estrela está condenado, sempre esteve, por factores naturais, ainda que o clima se mantivesse estável; no entanto, ainda que a arrogância e incompetência da turistrela os impeça de ver o óbvio, o aquecimento global, e as consequências que este irá trazer a todos os habitats de montanha na Europa, tal não modifica a realidade. E a realidade é que enquanto por toda a Europa se começa a pensar num amanhã sem turismo de neve, por cá continuamos com a nossa vocação para sermos originais, devendo a Serra da Estrela ser a única "estância de esqui" com planos para ampliar as suas instalações. Parece é que adicionalmente continua a existir aquele problemazito de terem que fazer um estudo de impacto ambiental; é que, parecendo que não, a Torre ainda é um espaço público e não propriedade da família Costa Pais. Que chatice!...Já agora, para ver o que a turistrela já fez, e o que planeia fazer na Torre, vão até à Estrela no seu melhor .


E o que dizer de uma câmara municipal, como a da Covilhã, que em vez de estar preocupada em requalificar o caos urbanístico e ambiental das Penhas da Saúde, tem planos para construir centenas de apartamentos na zona. De facto, as pessoas deste país anseiam desesperadamente por mais Costas da Caparica, mais Quarteiras e mais Praias da Rocha...as pessoas anseiam por vir à Serra da Estrela e sair dos seus apartamentos em Odivelas para se enfiar numa mini-cidade de montanha; como não perceber que o maior sonho de qualquer portuense que todos os dias desespera na Vci é fazer exactamente o mesmo, mas em altitude, a caminho da Torre...

Ah não, esperem, esquecia-me do milagroso teleférico que vai transportar milhares de pessoas por hora, ente os Piornos e a Torre, e que vai sem dúvida nenhuma evitar que as camionetas e os carros subam à Torre; claro que sim, como pude ser tão ingénuo!...Ah, e já agora, não se esqueçam de criar espaço nas cabines do teleférico para que os turistas transportem todo o tipo de resíduos que os ajudam a deslizar na neve (os mesmos que depois aproveitam para abandonar na Serra, ajudando a manter Torre como a lixeira a maior altitude no território continental, verdadeira maravilha do nosso Portugal). Claro que, entretanto, enquanto o milagre do teleférico não chega, fazem muito bem em continuar a fazer estradas que facilitam e estimulam o acesso de carro à Torre, como a recente ligação a partir de Loriga.

Claro que nada tenho contra, muito pelo contrário, a reabilitação do antigo sanatório e a construção de unidades hoteleiras de qualidade nas cidades que circundam a Serra; saúdo até o município de Belmonte pelo esforço no turismo cultural; até aceitaria uma aposta limitada no golfe, desde que feita em zonas ecologicamente não sensíveis, (evitando leitos de cheia, por exemplo), e com sistemas de reutilização da água de rega. Mas sabendo como estas coisas funcionam em Portugal, é de temer o pior...

Por tudo isto, o melhor Natal que a Serra da Estrela poderia ter era deixarem o gigante continuar a dormir em paz...




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