Recomendações gerais para cultivo de hortaliças orgânicas ? Parte II
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Recomendações gerais para cultivo de hortaliças orgânicas ? Parte II



O cultivo de hortaliças no sistema de produção orgânico não é apenas trocar os insumos utilizados na agricultura dita "moderna" (adubos químicos e agrotóxicos) por outros permitidos na produção de alimentos orgânicos. Além das recomendações gerais para a produção orgânica de hortaliças, já postada neste blog (parte I), existem inúmeras outras práticas muito importantes. pois tratam o solo como um "organismo vivo". Um solo sadio produz plantas, animais e homens sadios; tudo está ligado entre si como os órgãos de um corpo, por isso o solo, já na antiguidade, era visto como um "organismo vivo". O solo faz parte do meio ambiente e está ligado a todos os seus outros componentes, como a água, as plantas, os animais e o homem. Tudo que acontece com o solo tem algum reflexo positivo ou negativo, no ambiente do qual ele faz parte. Dentre as práticas que favorecem a vida do solo e as plantas cultivadas, destacam-se a adubação orgânica e verde, plantio direto, cultivo mínimo, cobertura morta, rotação e consorciação de culturas, entre outras. Estas recomendações são essenciais para o sucesso do cultivo orgânico, pois conduzem à estabilidade do meio ambiente, ao uso equilibrado do solo, ao fornecimento ordenado de nutrientes e à manutenção de uma fertilidade real e duradoura no tempo.
Adubação de semeadura/plantio
   O solo é o fator mais importante a ser considerado na produção orgânica de alimentos. O solo deve ser tratado como um organismo vivo que interage com a vegetação em todas as fases de seu ciclo de vida. Os aspectos físico, químico e biológico do solo são fundamentais para o sucesso na produção orgânica de hortaliças.
  O aspecto físico do solo refere-se à sua textura e a sua estrutura. A textura de um solo se relaciona ao tamanho das partículas que o formam; um solo possui diferentes quantidades de areia, argila, matéria orgânica, água, ar e minerais. A forma como esses componentes se organizam representa a estrutura do solo. Um solo bem estruturado deve ser fofo e poroso, permitindo a penetração da água e do ar, assim como de pequenos animais e raízes.
  O aspecto químico se relaciona com os nutrientes que vão ser utilizados pelas plantas. Esses nutrientes, dissolvidos na água do solo (solução), penetram pelas raízes das plantas. No sistema orgânico de produção, os nutrientes podem ser supridos através da adição de matéria orgânica e de compostos vegetais.
  O aspecto biológico trata dos organismos vivos existentes no solo e que atuam nos seus aspectos físicos e químicos. A vida no solo só é possível onde há disponibilidade de ar, água e de nutrientes. Um solo com presença de organismos vivos indica boas condições de estrutura.     
  Os microorganismos do solo são os principais agentes de transformação química dos nutrientes, tornando-os disponíveis para absorção pelas raízes das plantas.
A planta necessita, além de carbono, hidrogênio e oxigênio, de constituintes essenciais retirados do ar e da água, dos seguintes elementos:
. Macroelementos - nitrogênio (N), fósforo (P), potássio (K), cálcio (Ca), magnésio (Mg) e enxofre (S), exigidos em maior quantidade.
   O nitrogênio auxilia na formação da folhagem e favorece o rápido crescimento da planta. O fósforo estimula o crescimento e formação das raízes. O potássio aumenta a resistência da planta e melhora a qualidade dos frutos.
Microelementos - manganês (Mn), zinco (Zn), cobre (Cu), ferro (Fe), molibdênio (Mo), boro (B) e cloro (Cl), exigidos em quantidades reduzidas, mas também muito importantes para as plantas.
   As quantidades de macroelementos encontradas disponíveis para as plantas no solo, quase sempre, são insuficientes. Daí a necessidade de complementá-los através de adubos orgânicos. A vida do solo depende essencialmente da matéria orgânica que mantém a sua estrutura porosa, proporcionando a vida vegetal graças à entrada de ar e água. A matéria orgânica é um dos componentes do solo e atua como agente de estruturação, possibilitando a existência de vida microbiana e fauna, além de adicionar nutrientes à solução do solo. O adubo orgânico é constituído de resíduos de origem animal e vegetal: folhas secas, restos vegetais, esterco animal e tudo mais que se decompõe, transformando-se em húmus. O húmus é o resultado da ação de diversos microorganismos sobre os restos animais e vegetais.
O uso da matéria orgânica interfere significativamente na resistência das plantas, uma vez que:
   A adubação orgânica melhora também a qualidade dos alimentos, tornando-os mais ricos em vitaminas, aminoácidos, sais minerais, matéria seca e açúcares, além de serem mais aromáticos, saborosos e de melhor conservação.
Entre as espécies cultivadas, as hortaliças são as que mais respondem à aplicação de adubos orgânicos. O adubo orgânico de origem animal mais conhecido é o esterco que é formado por excrementos sólidos e líquidos de animais e pode estar misturado com restos vegetais. O esterco curtido de aves ou a cama de aviário e de gado são os mais comumente utilizados. Tanto o excesso como a falta de nutrientes são prejudiciais às plantas, pois um nutriente pode interferir na absorção dos demais.
   É importante lembrar que plantas bem nutridas são mais resistentes às doenças e às pragas. O ideal na adubação de hortaliças é o uso de composto orgânico, considerado o processo mais eficiente para produção de adubo orgânico de qualidade. A compostagem é o resultado da transformação, através da fermentação, do resíduo orgânico (restos vegetais) em adubo natural. É um dos princípios básicos da produção orgânica de alimentos. O composto é rico em húmus estabilizado e em microorganismos ativos que estimulam a saúde natural das plantas.
   Todos os passos para fazer, bem como os cuidados que se deve ter no preparo do composto orgânico, estão descritos em matéria já postada neste blog.
   O adubo orgânico, quando oriundo de esterco de animais não curtido, deve ser bem incorporado ao solo, 15 dias antes da semeadura/plantio. O uso de esterco ainda em fase de fermentação por ocasião da semeadura/plantio, pode causar danos às raízes e às sementes, tais como queima, destruição dos microorganismos do solo, formação de produtos tóxicos e morte da planta pelo calor. O conhecimento da origem do esterco, especialmente o de gado, é importante, pois o uso de alguns herbicidas nas pastagens pode afetar as plantas cultivadas.
Na falta de análise do solo, indica-se para solos de média fertilidade, anualmente, a seguinte adubação:
adubação orgânica, proveniente de compostagem - 3 a 4 kg/m2
. esterco de gado (4 a 5 kg/m2 ) ou de aves (1 a 2 kg/m2 ) curtidos    .
No caso de maior necessidade de potássio, cálcio e magnésio, recomenda-se cinzas de madeira não tratada com produtos químicos. Como fonte de fósforo, recomenda-se o fosfato natural, o fosfato de araxá, os termofosfatos e a farinha de ossos, aplicados com antecedência e de acordo com a análise de solo.
.Sistemas de semeadura/plantio
   Conforme a espécie de hortaliça, pode-se ter diferentes sistemas de semeadura/plantio.
.Semeadura direta: consiste na semeadura uniforme das sementes em sulcos, no canteiro, na profundidade de 1 a 2cm, utilizando-se marcadores ou sacho, cobrindo-as com a própria terra; pode ser feita também em covas ou em sulcos, sem preparo de canteiros. A quantidade de sementes por metro quadrado varia com o tamanho do canteiro; quanto menor, menos sementes serão gastas. Como regra geral, as sementes devem ficar enterradas numa profundidade de cinco vezes o seu tamanho.
.Plantio direto: consiste no plantio de tubérculos, raízes, rizomas, bulbilhos, ramas, filhotes e estolhos em sulcos, em covas, ou em camalhões, na profundidade de 5 a 10 cm, utilizando-se enxada ou sacho, no espaçamento indicado para cada espécie; pode ser feito também em sulcos, ou em covas, diretamente no canteiro.
Figura 1. Terreno preparado para o plantio de ramas de batata-doce no alto da leira
.Transplante de mudas: consiste na mudança das plantas que cresceram na sementeira ou em recipientes, para o local definitivo em sulcos ou em covas, enterrando-as até à profundidade em que estavam na sementeira ou em recipiente, no espaçamento indicado para a espécie. Deve ser feito, preferencialmente, em dias nublados ou à tardinha para garantir melhor pegamento, principalmente no verão.
   No caso de sementeiras em canteiros ou em caixas, uma irrigação abundante antes do transplante facilita a retirada das mudas. Quando as mudas são produzidas em copinhos ou em bandejas o pegamento é maior, pois a maioria das raízes estão intactas no torrão formado nesses recipientes. Para retirá-las da bandeja basta umedecer um pouco e bater de leve no fundo.
Figura 2. Transplante de mudas de couve-brócolis
. Plantio direto e cultivo mínimo
   O sistema de plantio direto e cultivo mínimo são práticas importantíssimas no cultivo orgânico de hortaliças, tendo em vista que a maioria dos nossos solos estão sujeitos a processos de erosão causado por chuvas intensas, aliado a baixos teores de matéria orgânica. Outra vantagem dessas práticas é o fato do solo estar sempre preparado para semeadura/plantio, mesmo em períodos chuvosos que não permite o revolvimento do mesmo devido a umidade excessiva. Para o plantio direto ou cultivo mínimo, bastar fazer uma roçada utilizando uma foice ou roçadeira manual para áreas maiores e abrir as covas ou sulcos.
  O plantio direto é um método que não revolve o solo. A camada de cobertura vegetal é mantida e se faz apenas a abertura de um pequeno sulco ou cova onde é colocada a semente ou a muda.
  O cultivo mínimo é a mínima manipulação do solo necessária para a semeadura ou plantio de mudas. Deixa-se uma considerável quantidade de cobertura na superfície (resíduos culturais), o que desfavorece a erosão do solo.
 Efeitos da adoção dos sistemas plantio direto e cultivo mínimo nas propriedades do solo visando a produção de hortaliças orgânicas.

Figura 3. Cultivo mínimo (abertura de sulco) sobre aveia-preta semeada no outono
Figura 4. Cultivo mínimo do tomateiro sobre cobertura de aveia+ervilhaca+nabo forrageiro
Figura 5. Cultivo mínimo de aipim sobre cobertura de aveia e ervilhaca
 . Práticas culturais
   Para que as hortaliças tenham bom desenvolvimento, é necessário realizar diversos tratos culturais na época adequada.
 . Espécies de plantas de cobertura do solo e adubação verde
   As plantas de cobertura exercem importante papel na conservação do solo, no suprimento de nutrientes como nitrogênio, fósforo e potássio, no equilíbrio das propriedades do solo e, principalmente, no manejo de plantas espontâneas. As plantas de cobertura são a garantia de continuidade da vida. Para existir vida no solo, princípio básico para produção de alimentos, o terreno deverá ser suprido continuamente de alimento (matéria orgânica e outros nutrientes, além do ar e da água) para que os bilhões de seres vivos que ali se encontram possam interagir química e fisicamente para melhorar a estrutura do solo, disponibilizando nutrientes essenciais para as culturas.
  A adubação verde é uma das formas mais importantes de adubação orgânica do solo. Consiste no cultivo de algumas espécies de plantas que, ao serem incorporadas ou derrubadas no solo, fornecem matéria orgânica, servindo ainda como cobertura do solo, evitando a erosão. Além disso, podem fornecer nitrogênio, funcionam como subsoladores naturais do solo, pois suas raízes atingem diferentes profundidades trazendo nutrientes do fundo até à superfície, facilitando assim a nutrição das plantas. Funcionam como verdadeiros descompactadores do solo permitindo a entrada de ar e de água de maneira adequada no solo.
   Atualmente, une-se o uso de plantas de adubação verde e de plantas de cobertura de solo com objetivo de promover benefícios significativos para a agricultura orgânica, aliado ao uso de sistemas de rotação, sucessão e consorciação de culturas, plantio direto, cultivo mínimo, uso de adubação orgânica e outros princípios. As plantas da família botânica das leguminosas, encontradas em grandes diversidades de clima e solo, são consideradas ótimas para adubação verde por serem ricas em nitrogênio e possuírem raízes ramificadas e profundas. A mucuna cultivada isoladamente ou em consorciação com milho-verde é um exemplo de espécie de adubação verde e de cobertura do solo. O coquetel de adubos verdes (aveia -60 kg/ha; ervilhaca -18 kg/ha e nabo forrageiro ? 4 kg/ha) é também uma ótima opção para melhorar a cobertura do solo, promover o efeito benéfico no manejo de plantas espontâneas e aprimorar a eficiência na ciclagem de nutrientes (fornecendo nitrogênio e reciclando nutrientes) e na descompactação do solo.
Figura 6. Desenvolvimento inicial de brássicas sobre cobertura de aveia + ervilhaca+ nabo forrageiro
 Figura 7. Desenvolvimento vegetativo do milho-verde orgânico sobre cobertura de aveia + ervilhaca+ nabo forrageiro

Os principais benefícios da adubação verde são:
. Físicos ? redução do impacto das gotas de chuva, melhor estrutura do solo, maior retenção de água e menor variação da temperatura no solo;
. Químicos - aumento do teor de húmus no solo, enriquecimento de nutrientes (poupança verde) e maior disponibilidade e movimentação de nutrientes. Devido ao sistema radicular profundo de algumas plantas utilizadas como adubo verde, é feito uma reciclagem dos nutrientes já lixiviados e perdidos nas camadas profundas;
. Biológicos - aumento na atividade de microorganismos, no manejo de ervas espontâneas e no uso da alelopatia e, favorecimento às atividades da fauna do solo (minhocas).
. Cobertura morta
   Essa prática consiste na colocação de capim ou palha seca (5 a 10cm) e outros materiais como bagaço de cana nas entrelinhas das hortaliças cultivadas em espaçamentos maiores. A cobertura morta mantém a superfície do solo sem a formação de crosta (superfície endurecida), evita a evaporação da água da chuva ou da irrigação, reduz a erosão em solos inclinados, diminui a temperatura do solo no verão e, principalmente, economiza capinas devido à menor incidência de plantas espontâneas. Trabalhos de pesquisa evidenciam que, dependendo da cobertura morta, é possível reduzir a temperatura do solo em até 10ºC, quando comparado ao solo descoberto. Resíduos vegetais em decomposição não devem ser aplicados, pois a sua fermentação é prejudicial às plantas.
Figura 8. Cobertura morta com casca de arroz no cultivo orgânico de morango na Epagri/Estação Experimental de Urussanga, SC,
 Figura 9. Cultivo orgânico de repolho em cobertura de palha de milho na Estação Experimental de Urussanga
Figura 10. Cultivo orgânico de couve-flor sobre cobertura de palha de arroz na Estação Experimental de Urussanga




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